“Existe mais de uma
maneira de queimar um livro. E o mundo está cheio de pessoas carregando
fósforos acesos.”
Ray Bradbury – Fahrenheit 451
Hoje é um dia extremamente triste. O incêndio
do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, reduziu a cinzas mais de duzentos anos de
história. Milhares de documentos, livros e artefatos arqueológicos foram
consumidos pelo fogo. Muito mais do que papéis e objetos, o que queimou na
noite deste domingo foi a nossa memória. Infelizmente, esse incêndio era uma
tragédia anunciada. Ele reflete o descaso com que a História é tratada nesse
país. Quando vemos um governo congelar os investimentos em educação e cultura
por 20 anos, através da PEC 241, fica claro que a ignorância e o desprezo pela
cultura é um projeto político.
Enquanto eu assistia as chamas consumir o
Museu Nacional pela TV, com um nó na garganta e o coração apertado,
inevitavelmente veio à minha mente o livro Fahrenheit
451, de Ray Bradbury. O livro, escrito em 1953, nos apresenta um futuro
onde a leitura é criminalizada e aos bombeiros caberia a tarefa de encontrar e incendiar
livros. A ignorância, o desprezo pela reflexão, pela cultura e pela História
são as principais marcas desse mundo distópico criado por Bradbury. O autor nos
apresenta até a receita para a imbecilização do homem:
“A
escolaridade é abreviada, a disciplina relaxada, as filosofias, as histórias,
as línguas são abolidas, gramática e ortografia pouco a pouco negligenciadas,
e, por fim, quase totalmente ignoradas. A vida é imediata, o emprego é que
conta, o prazer está por toda parte depois do trabalho. Por que aprender alguma
coisa além de apertar botões, acionar interruptores, ajustar parafusos e
porcas?”
É assustador constatar que entre a distopia
criada por Ray Bradbury e a atual situação do Brasil não há nenhuma linha que
separe ficção da realidade. Vivemos, diariamente, a nossa própria distopia. Ler
Fahrenheit 451 é como ver nossa
imagem refletida em um espelho. Aqui, valorizamos a ignorância em detrimento da inteligência.
As opiniões substituem as reflexões. Vomitamos nossos preconceitos e nosso ódio
nas redes sociais e acreditamos em todo tipo de fake news. Tudo isso se intensifica
na mesma proporção em que desprezamos a História e a cultura. Aqui, prevalece a
política de “deixar os historiadores para
lá”.
O incêndio do Museu Nacional reflete essa situação. Não foi acidente. O incêndio está em perfeita harmonia com o projeto de poder que impera no Brasil. As luzes que
tomaram conta da Quinta da Boa Vista estão tragicamente ligadas aos tempos sombrios
que estamos atravessando.
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